Deputado manda R$ 1,5 mi a entidade que exibe sua foto em ação a fiéis
Fundação que receberá emenda de deputado ligado a Assembleia de Deus promove imagem do parlamentar em ação de saúde para fiéis da igreja
atualizado
Compartilhar notícia

O deputado estadual Oseias de Madureira (PSD), que é ligado à Assembleia de Deus, tem usado suas redes sociais para divulgar uma caravana de exames médicos para fiéis em São Paulo, decorada com uma imagem dele ao lado de pastores da igreja (foto em destaque).
O programa é financiado pela Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem (Fidi), para onde Oseias destinou R$ 1,5 milhão em emendas parlamentares neste ano – valor que ainda não foi empenhado, ou seja, não foi transferido pelo governo do estado.
A van utilizada na caravana exibe a foto de Oseias ao lado do deputado federal Cezinho de Madureira (PSD) e do bispo Samuel Ferreira, junto com sua esposa, Keila Ferreira, líderes da Igreja da Assembleia de Deus – a bispa morreu em fevereiro deste ano.
O veículo transporta os equipamentos da ação que já visitou igrejas da sigla em 66 municípios paulistas, desde março de 2024.
Segundo a Fidi, o projeto já fez 4.835 exames dos tipos Papanicolau, ultrassom de diferentes regiões do corpo, ecocardiograma, colesterol, glicose, e PSA livre, que testa a quantidade de proteínas no sangue.
Oseias usa suas redes sociais para divulgar a próxima igreja a receber a caravana e compartilhar depoimentos de fiéis que foram atendidos.
Em um desses vídeos, há o relato de pessoas que dizem ter conseguido realizar procedimentos que tinham longas filas de espera no Sistema Único de Saúde (SUS) por meio da ação.
Destinação de R$ 1,5 milhão
- A emenda destinada por Oseias à Fidi é do tipo impositiva, o que significa que faz parte do orçamento público.
- Cada deputado estadual paulista tem R$ 10 milhões em emendas desse tipo para destinar a organizações da sociedade civil ou órgãos públicos – pelas regras, 50% desse valor devem ter como alvo ações de saúde.
- As emendas são uma forma do orçamento atender necessidades específicas de cada região do estado, já que um parlamentar teria mais o às demandas particulares das comunidades das quais é ligado.
Ainda assim, as emendas precisam seguir o princípio da impessoalidade, previsto nas regras de gestão pública, como explicou o advogado especialista em Direito istrativo Valdir Simão ao Metrópoles.
“Um dos princípios mais importantes que regem a istração pública é a impessoalidade. A gente não pode confundir a função pública, a política pública, com a pessoa, o agente público, o político, que é responsável por patrocinar ou executar aquela política pública”, disse o advogado.
Simão explica que ainda que o valor da emenda não tenha relação direta com o financiamento das caravanas – o que, segundo ele, a Fidi terá que demonstrar em suas prestações de contas –, há um problema de transparência na destinação dos recurso por Oseias.
“A princípio, você tem um problema claro de transparência, porque você tem uma figura pública, um parlamentar, que direciona recursos públicos de emendas para a entidade, e a entidade faz uma promoção desse parlamentar. Isso pode, na minha opinião, deslegitimar a atividade da entidade na captação de recurso público”.
Para o advogado, essa falta de transparência poderia afetar, inclusive, os contratos que a fundação possui com órgãos públicos. A Fidi também presta serviço e realiza exames para a Secretaria Estadual de Saúde. Só em 2025, a fundação já recebeu R$ 19.2 milhões por serviços médicos prestados ao estado.
O que diz o deputado Oseias
Ao Metrópoles o deputado estadual Oseias de Madureira argumentou que a emenda não tem relação com a caravana e foi destinada à Fidi para contribuir com “custeio de serviços prestados em unidades públicas de saúde”. Ele destacou como argumento que o valor ainda não foi empenhado.
Segundo o parlamentar, o financiamento da caravana é feito com recursos da própria Fidi e tem um propósito “puramente filantrópico”. A Assembleia de Deus, segundo ele, é responsável somente por ceder o espaço para a efetivação da ação, cumprindo o papel de ajudar a fundação a ir “onde a sociedade não alcança”.
Sobre a foto projetada no van, o Oseias disse que o veículo não faz parte da ação da Fidi, sendo usado apenas para auxiliar no transporte de equipamentos do projeto.
O gabinete do parlamentar ainda enviou uma nota ao Metrópoles esclarecendo que “o custeio desse veículo é realizado com recursos do salário do Deputado, não havendo qualquer vínculo com verba pública ou emenda parlamentar. Trata-se de medida pessoal e voluntária, voltada à ampliação da abrangência do projeto, que conta com o apoio de uma entidade filantrópica, sem fins lucrativos”.
A Fidi, por sua vez, disse que é responsável “pela execução técnica e operacional desses exames, não mantendo qualquer vínculo jurídico, contratual ou institucional com a Igreja Assembleia de Deus – Ministério de Madureira (AD BRÁS)”.
Em nota, a fundação escreveu que “até o presente momento, não houve ree de recursos financeiros oriundos de emendas parlamentares indicadas pelo Deputado Estadual Oséias de Madureira. O eventual recebimento desses valores será integralmente destinado ao custeio dos serviços ofertados nas unidades de saúde públicas atendidas pela FIDI em diversas regiões do Estado de São Paulo”.
A repeito do uso do espaço das igrejas, a fundação escreveu que “a definição dos locais para a realização das ações segue critérios técnicos e istrativos”, e completa que isso pode ocorrer eventualemente “em imóveis ligados a instituições religiosas que ofereçam a estrutura física necessária, sem que isso represente qualquer vínculo institucional”. Segundo a fundação, “colaboração com o parlamentar decorre da convergência de objetivos entre as partes”.